Despesas dedutíveis (Parte 2/5)
Dedução com dependentes

A inclusão de dependentes no Imposto de Renda nem sempre traz vantagens, pois, apesar de gerar das deduções na base de cálculo do imposto, pode também gerar novos rendimentos tributáveis. Aprenda como avaliar se uma possível dedução pode se transformar em uma obrigação tributária adicional.
Esse é o segundo informativo da nossa série "Você paga gorjeta ao Governo?"

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Sobre o informativo:

Se a você interessa mais a parte prática, ou seja, a "dica" jurídica que poderá te ajudar, pule direto para a Terceira Seção, "Conteúdo Jurídico". O conteúdo relevante está lá e independe das seções anteriores.

Se a você interessa o "Conteúdo Jurídico" e, além disso, entender situações onde possa ser útil de forma objetiva, pule para a Segunda Seção, "Estudo de caso".

Por fim, se você não tem pressa, tem paciência para algumas divagações e gostaria de entender melhor as ideias mais "filosóficas" que justificaram a elaboração desse conteúdo, leia desde a Primeira Seção, "Pensamentos do Autor".

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Pensamentos do Autor
Bônus e ônus

Eu já fui eleito representante de turma no colégio. Era apenas meu segundo ano em um novo colégio e eu “concorri” com alunos mais antigos, então, na época, isso me pareceu uma grande conquista. Mais do que isso, ser representante de turma trazia alguma moral extra com professores, além, é claro, da dispensa de algumas aulas para atender aos interesses coletivos da turma. Confesso que foi especialmente por causa dessa última vantagem que eu quis concorrer.

No começo tudo funcionou perfeitamente. Eu participei de algumas reuniões com os outros representantes de turmas. Eu podia pedir autorização dos professores para dar recados e, ocasionalmente, me ausentar para resolver problemas. Tudo estava indo muito bem, até que fui convocado para uma reunião na parte da tarde. Detalhe: eu estudava de manhã – o que significava que eu teria que voltar para o colégio depois do almoço. Logo esse tipo de convite passou a se tornar mais frequente. Logo eu tinha obrigações de passar recados e organizar votações na turma. Em pouco tempo minhas vantagens eram menores do que minhas obrigações, e eu só fui descobrir isso quando não podia fazer mais nada. Não existia renúncia (ou impeachment) de representante de turma. Fiquei o ano inteiro tendo um compromisso adicional no meu calendário escolar. A experiência foi interessante, mas, no ano seguinte, não concorri à reeleição.

O ponto aqui é simples: nem sempre situações que se mostram como vantagens efetivamente o são.

Muitas pessoas acreditam que declarar dependentes no imposto de renda é vantajoso. Isso pode ser verdade. Não necessariamente o é. Declarar dependentes, além das deduções autorizadas, implica na obrigação de declarar seus rendimentos como se fossem seus. Quando os dependentes estão no colégio, isso pode ser ótimo. Quando eles passam a ser estagiários / assalariados, talvez não seja.

Eu não sabia como era o exercício da função de representante de classe. Eu poderia ter estudado e perguntado pra outras pessoas que já tivessem sido. Não fiz minha lição de casa e ocupei muitas tardes do meu ano por conta disso. Se algum dependente seu recebe rendimentos, é melhor estudar se vale a pena mantê-lo como dependente. Essa “vantagem” pode implicar, na verdade, em um aumento de seu tributo.

É como diz a terceira lei de Newton: “todo bônus tem seu ônus”.

Estudo de caso
Contrariando expectativas

O Sr. Victor sempre foi responsável com sua declaração de imposto de renda. Quando completou 52 anos em 2017, já havia prestado informação à Receita Federal em pelo menos 28 deles. A conta era impecável: nenhum problema.

Nesse ano, contudo, as coisas foram diferentes. O Sr. Victor, até então “invicto”, foi surpreendido ao transmitir sua declaração de imposto de renda de 2017. O sistema acusou uma pendência na declaração de 2016 (referente ao ano de 2015). O motivo lhe era estranho: ele havia deixado de informar rendimentos tributáveis.

Infelizmente, Victor incorreu em um erro muito comum. Os rendimentos tributáveis não eram seus. Seu filho, declarado como dependente em 2016, já havia começado a estagiar em 2015 e passado a receber bolsa-estágio. Seus rendimentos, inclusive, eram superiores às deduções que ele gerava.

Resultado: Victor teve que apresentar uma retificação de sua declaração. Ele, que tinha valores a receber (restituição), passou a ter IR a pagar, além de juros pelo período. Seu dependente não havia gerado deduções, e sim acréscimos ao seu IR.

Conteúdo jurídico
Entendendo a inclusão de dependentes na declaração de IR

Quem pode ser considerado dependente?

Antes de mais nada, é importante saber quem pode ser considerado dependente para fins de IR.

De acordo com a legislação, as seguintes pessoas podem ostentar a condição de dependente:

  • companheiro(a) com quem o contribuinte tenha filho ou viva há mais de 5 anos, ou cônjuge;
  • filho(a) ou enteado(a), até 21 anos de idade, ou, em qualquer idade, quando incapacitado física ou mentalmente para o trabalho;
  • filho(a) ou enteado(a), se ainda estiverem cursando estabelecimento de ensino superior ou escola técnica de segundo grau, até 24 anos de idade;
  • irmão(ã), neto(a) ou bisneto(a), sem arrimo dos pais, de quem o contribuinte detenha a guarda judicial, até 21 anos, ou em qualquer idade, quando incapacitado física ou mentalmente para o trabalho;
  • irmão(ã), neto(a) ou bisneto(a), sem arrimo dos pais, com idade de 21 anos até 24 anos, se ainda estiver cursando estabelecimento de ensino superior ou escola técnica de segundo grau, desde que o contribuinte tenha detido sua guarda judicial até os 21 anos;
  • pais, avós e bisavós que tenham recebido rendimentos, tributáveis ou não, até R$ 22.847,76 (valor de referência para a declaração de IR de 2017);
  • menor pobre até 21 anos que o contribuinte crie e eduque e de quem detenha a guarda judicial;
  • pessoa absolutamente incapaz, da qual o contribuinte seja tutor ou curador.

Essa listagem é taxativa, ou seja, o contribuinte não pode incluir como dependente pessoa diferente daquelas que constam na lista.

ATENÇÃO: em regra cada indivíduo só pode constar como dependente em uma declaração. Assim, por ex., no caso de um casal com o filho em comum, somente um dos cônjuges / companheiros poderá o declarar como seu dependente, e não os dois, sob o risco de ambos serem intimados a prestar esclarecimentos à Receita Federal (esse é um dos erros mais fáceis de o sistema da Malha Fina detectar ao cruzar informações).

Vale a pena declarar dependentes no IR?

Depende.

A decisão sobre declarar (ou não) dependentes no IR deve ser baseada em contas. Não existe receita de bolo: se a conta trouxer mais deduções do que rendimentos tributáveis, vale a pena; caso contrário, não vale.

Para fazer essa conta, é importante entender melhor a lógica. O conceito por trás de dependentes é o de unicidade patrimonial. É como se o patrimônio do dependente fizesse parte do patrimônio do declarante, de modo que todos os rendimentos e deduções do dependente devem ser tratados como sendo do declarante.

Suponha uma mãe que tenha um filho, menor de 21 anos, com o seguinte perfil:

  • Como estagiário, recebe R$ 1.500,00 por mês, além de R$ 100,00 de vale-alimentação e R$ 100,00 de vale-transporte;
  • Sua faculdade custa R$ 1.000,00 por mês;
  • Pensando em se aposentar mais cedo, o filho contribui para o INSS com R$ 150,00 por mês;
  • A mãe paga seu plano de saúde, no valor de R$ 350,00 por mês.

Para verificar se vale a pena (ou não) incluir seu filho, a mãe deverá fazer as seguintes contas ao final do ano:

  • Rendimentos tributáveis do filho = (+) 18.000,00 (os rendimentos de vale-alimentação e de vale-transporte, no total de R$ 2.400,00, são isentos, ou seja, não devem ser considerados para fins de cálculo do IR)
  • Despesas com dependentes = (-) 2.275,08 (dedução por dependente - valor para a declaração de IR de 2017)
  • Despesas com previdência oficial = (-) 1.800,00 (não há limite para dedução com esse tipo de despesa)
  • Despesas com educação = (-) 3.561,50 (apesar de o gasto ser de R$ 12.000,00, há um limite máximo de dedução para despesas com educação, no valor de R$ 3.561,50)
  • Despesas médicas = (-) 4.200,00 (não há limite para dedução com esse tipo de despesa)

RESULTADO FINAL = (+) 6.163,42

No caso acima, a inclusão de seu filho como dependente, mesmo com as despesas de educação e saúde, geraria um acréscimo na base de cálculo de seu próprio IR de R$ 6.163,42. Isso significa que ela pagaria até R$ 1.695,00 a mais em razão dessa inclusão.

O objetivo desse material é mostrar que incluir dependentes na declaração do IR nem sempre é a melhor opção. Para isso, é necessário fazer contas considerando, inclusive, outras despesas dedutíveis, sobre as quais falaremos em outros materiais. Essa conta pode ser feita em relação a períodos anteriores, para verificar tributos eventualmente pagos desnecessariamente. A depender da existência de comprovantes, ainda pode ser possível reaver alguns valores.

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