Imposto de Renda
Você caiu na malha fina?

Cair na malha fina pode ser um pesadelo para quem apresenta sua declaração de Imposto de Renda à Receita Federal sem auxílio de profissionais. Em regra essas pessoas são surpreendidas por intimações para que prestem esclarecimento e, na urgência, tem que recorrer a profissionais, que geralmente cobram mais caro por isso. Saber o status de sua declaração pode evitar essa situação. E você, sabe como conferir se caiu na malha fina?

malha fina

Sobre o informativo:

Se a você interessa mais a parte prática, ou seja, a "dica" jurídica que poderá te ajudar, pule direto para a Terceira Seção, "Conteúdo Jurídico". O conteúdo relevante está lá e independe das seções anteriores.

Se a você interessa o "Conteúdo Jurídico" e, além disso, entender situações onde possa ser útil de forma objetiva, pule para a Segunda Seção, "Estudo de caso".

Por fim, se você não tem pressa, tem paciência para algumas divagações e gostaria de entender melhor as ideias mais "filosóficas" que justificaram a elaboração desse conteúdo, leia desde a Primeira Seção, "Pensamentos do Autor".

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Pensamentos do Autor
"Automedicação" jurídica

Nunca gostei de usar remédios. Me lembro que, enquanto morei com meus pais, até os 18 anos, tive poucos problemas de saúde (ao menos em comparação com minhas irmãs) e, por isso, sempre optava por esperar meu corpo melhorar de enfermidades. Por conta disso, nunca soube muito bem quais remédios usar em casos razoavelmente comuns, como dores de estômago, gripes, etc, e durante muito tempo consultei minha irmã, campeã na arte da automedicação (consumo de remédios sem prescrição médica), como referência para o assunto.

Mais velho, em um trabalho que fiz sobre tributação de medicamentos, acabei descobrindo que há uma grande controvérsia na área da saúde acerca da automedicação, com discussões sobre até que ponto a restrição a essa prática, tão comum em sociedades modernas, pode ser benéfica à saúde da população em geral. Claro que os profissionais da área não esperam que, por causa de uma dor de cabeça, a pessoa deixe de tomar um comprimido de analgésico e marque uma consulta médica. O objetivo é buscar meios de que as pessoas entendam melhor sobre o que estão fazendo e quais as consequências disso. A campanha criada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) sobre o assunto chama-se: "Informação é o melhor remédio".

Ao olhar esse cenário, não consigo deixar de associar a situação com um problema que me deparo com frequência: pessoas que se "automedicaram" em matéria jurídica e, por causa disso, pagaram preços altos. Pessoas que sofreram penhoras bancárias ou de seus bens, que perderam negócios, e que, no fim, tiveram que recorrer a advogados em situação de estresse para resolver problemas que sequer deveriam existir.

Já tive a oportunidade de conversar com um Fiscal responsável pela Malha Fina, e a impressão que ele compartilhou comigo foi exatamente essa: muitas pessoas se enrolam e criam passivos tributários por falta de informação. Pessoas que não tiveram intenção de cometer nenhum ilícito fiscal, tanto que apresentaram suas Declarações de Imposto de Renda (DIRPF), mas deixaram de informar, por exemplo, a bolsa estágio de seus filhos. Esse esquecimento, muitas vezes causado pelo desconhecimento, pode gerar débitos de Imposto de Renda com aplicações de multas, e transformar um pequeno equívoco num valor bastante significativo. E isso não se restringe à área fiscal - em outras áreas do direito esse efeito pode ser muito pior.

Não estou dizendo que você deva procurar um advogado cada vez que for fazer um negócio jurídico ou prestar alguma informação que possa ter consequências tributárias. Se você acompanhou nossos dois primeiros informativos (links - Informativo n.º 1 e Informativo n.º 2), verá que minha intenção é justamente outra: informar as pessoas para que elas possam avaliar a conveniência de ter um advogado, ou não, em determinadas situações.

Não é porque você sabe qual remédio alivia sua dor muscular que os sintomas podem ser ignorados. Entender seu patrimônio e conhecer os riscos aos quais está sujeito são ações imprescindíveis para uma boa gestão, mas não são as únicas. Uma boa assessoria jurídica pode trazer benefícios com as prescrições corretas, e a ausência de análise especializada pode impactar negativamente na sua saúde financeira.

A automedicação jurídica pode ser eficiente, mas também inconsequente e desnecessária. "A diferença entre remédio e veneno é a dose".

Estudo de caso
Remédio errado, consequências patrimoniais

Victor, casado e pai de um filho, não estava acostumado a se preocupar com suas obrigações fiscais, pois até determinado momento não possuía rendimentos, patrimônio ou realizava operações tributáveis que o obrigassem a apresentar sua Declaração de Imposto de Renda (DIRPF) (se você não conhece os critérios que lhe obrigavam a apresentá-la em 2017, clique aqui). Em 2012, contudo, ele recebeu rendimentos em valores suficientes para obrigá-lo a prestar contas ao Fisco Federal e, dessa forma, em 2013, ele apresentou sua DIRPF, incluindo como seus dependentes sua esposa, que também trabalhava e recebia rendimentos tributáveis, e seu filho.

Alguns anos depois, em 2015, quando se preparava para uma cirurgia de seu filho, a bomba explodiu: os valores em sua conta corrente foram integralmente bloqueados do dia para a noite. Victor havia sofrido uma penhora online por conta de uma execução fiscal (ação de cobrança movida pela Fazenda Nacional).

Ao ter sua situação fiscal verificada por um advogado, Victor descobriu o problema: em 2013, quando apresentou sua DIRPF e incluiu sua esposa como dependente, Victor também deveria ter declarado os rendimentos recebidos por ela em 2012. Como não o fez, o sistema da Receita Federal detectou uma inconsistência em sua declaração - Victor caíra na Malha Fina. A inconsistência não foi sanada a tempo, foi apurado um débito adicional de imposto de renda, posteriormente cobrado na execução fiscal que gerou a penhora bancária.

Conteúdo jurídico
Como se antecipar à malha fina da Receita Federal

O link acima lhe direciona para a página de login do "Centro Virtual de Atendimento" da Receita Federal (e-CAC). Por meio desse site, o contribuinte tem acesso a uma série de serviços junto à Receita Federal, sem a necessidade de comparecer pessoalmente a um dos Centros de Atendimento ao Contribuinte (CAC) - que, acredite, são bem complicados, para dizer o mínimo.

Para acessar o sistema é necessário gerar um "Código de Acesso". Para gerá-lo você precisará informar CPF, data de nascimento e números dos recibos de entrega das declarações do contribuinte nos últimos dois anos (documento gerado logo após a entrega da Declaração de Imposto de Renda - DIRPF pelo programa da Receita Federal). Esse procedimento não demora nem dois minutos. 

Dentro do sistema, você pode fazer várias consultas, imprimir as guias de recolhimento (DARF) para pagamento das parcelas do Imposto de Renda, solicitar o débito automático das cotas, entre outras facilidades.

Uma das consultas é a do "Extrato de Processamento da DIRPF", dentro do menu "Declarações e Demonstrativos", que permite verificar o status de sua DIRPF no campo "Situação". Se o campo indicar a mensagem "Com Pendências", é possível consultar a inconsistência identificada pela Receita Federal antes mesmo de ser intimado para saná-la. Em alguns casos, todavia, pode ser necessário apresentar presencialmente documentos à Receita Federal.

O problema que apresentamos de Victor é o mesmo de muitas pessoas, especialmente as que possuem filhos jovens, declarados como dependentes, quando começam a trabalhar e receber salários, bolsas de estágio, etc.

Ao incluir uma pessoa como dependente, você tem direitos a deduções de IR relativos a essa pessoa (tais como despesas com educação e saúde, além de um valor relativo ao próprio dependente - em 2017 foi de R$ 2.275,08). Por outro lado, você também fica obrigado a declarar todos os rendimentos tributáveis dessa pessoa como se fossem seus.

Por exemplo, se a esposa de Victor recebeu rendimentos tributáveis de R$ 18.000,00 em 2012 (R$ 1.500,00 por mês), ela não precisaria pagar nada de Imposto de Renda, pois tal valor está na faixa de isenção do IR. Porém, se Victor a declarar como sua dependente, a depender de seus próprios rendimentos, essa inclusão pode gerar um débito de IR no valor de até R$ 4.406,95 (acréscimo de R$ 18.000,00 - dedução de R$ 1.974,72 por dependente em 2012). Em outras palavras, declará-la nesse cenário é (foi) uma péssima escolha do ponto de vista fiscal.

Se você, tal como Victor, opta por apresentar suas Declarações de Imposto de Renda sem o auxílio de profissionais (como contadores ou advogados), é extremamente importante que você conheça o sistema e-CAC. Assim como a situação fiscal, apresentada em nosso Informativo n.º 1, o "Extrato de Processamento da DIRPF" é uma ferramenta poderosa para lhe ajudar a evitar problemas, pois permite que você acompanhe a análise de sua declaração, e, em caso de inconsistência, verifique o quê precisa sanar, ou seja, impede o desconhecimento fático - conceito com o qual encerramos o Informativo n.º 2, em trecho que merece a repetição:

"Uma das atitudes mais prudentes para você proteger seu patrimônio contra o desconhecimento técnico é evitar o desconhecimento fático. Conheça sua exposição, procure auxílio para equalizar seus problemas e, com isso, evite o custo adicional para resolver situações urgentes."

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